Há quase um ano só se fala nisto: no filme realizado com dinheiro público sobre a vida de Bruna Surfistinha. Agora, que a data de estreia do filme se aproxima, o massacre midiático perdeu qualquer parâmetro e as manchetes dos portais de internet estão recheadas de importantes “informações” a respeito do evento cultural de proporções épicas.
No IG, a tarefa é “entender o guarda-roupa” de Bruna (http://chic.ig.com.br/moda/noticia/com-camiseta-da-laundry-no-figurino-em-bruna-surfistinha-em-estreia-nos-cinemas-entenda-o-guarda-roupa-da-personagem ). Aproveitando-se de sua onda de popularidade, Bruna terá uma loja e dará cursos (http://delas.ig.com.br/amoresexo/bruna+surfistinha+lanca+loja+e+da+cursos+eroticos/n1238096489586.html ).
No Uol, sabemos como foi a pré-estreia do filme no Rio: http://celebridades.uol.com.br/album/pre_estreia_surfistinha_rj_album.jhtm?abrefoto=22 .
No Terra, ficamos sabendo que o papel de Bruna é o “mais difícil da carreira (?) de Deborah Secco”: http://terratv.terra.com.br/Noticias/Celebridades/4936-347752/Bruna-me-permitiu-mostrar-uma-atriz-nunca-vista-diz-Deborah.htm .
No Estadão, a mesma Deborah diz que o filme pode “quebrar preconceitos”: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,historia-de-bruna-surfistinha-pode-quebrar-preconceitos--diz--deborah-secco,683112,0.htm .
No Globo.com, somos informados que um jogador de futebol reserva em seu clube fez uma ponta no filme: http://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/noticia/2011/02/dentinho-faz-ponta-em-filme-e-ganha-elogios-de-bruna-surfistinha.html .
Nada disso, entretanto, está escondido nos inúteis suplementos culturais dos jornais e dos portais na Internet, ou nas seções reservadas às vicissitudes das celebridades. Estamos falando de manchetes, de destaques “à altura” do fenômeno Bruna.
O filme, obviamente, foi pago com dinheiro público: foram mais de 3 milhões de reais (http://sif.ancine.gov.br/projetosaudiovisuais/ConsultaProjetosAudiovisuais.do?method=detalharProjeto&numSalic=070091 ).
Persiste aquela dúvida da motivação de alguma empresa em patrocinar um filme que tenta transformar uma ex-profissional do sexo em modelo de comportamento e ídolo popular. Os empresários querem “retorno para a marca” ao associar seus nomes ao de Bruna? Pois bem, aqui estão algumas dessas marcas: http://www.brunasurfistinhaofilme.com/ . Destaque óbvio para prefeituras e órgãos públicos de fomento à atividade industrial.
Fico imaginando a cabeça de um pai de família, comerciante, décadas de trabalho duro, precisando de um empréstimo de banco público que não sai nunca para pagar suas obrigações trabalhistas, por exemplo, ao ver o sucesso da empreitada de Bruna. A diferença de um país de verdade para um amontoado de gente como o Brasil talvez seja que, no primeiro caso, uma pessoa pode mudar de vida e transformar-se através de um longo processo de autoconhecimento, austeridade e aprendizado pessoal – no segundo caso, ela simplesmente dorme fazendo coisa errada e acorda sendo endeusada como ícone de comportamento, destilando regra, oprimindo as “pessoas comuns” com seu novo status de celebridade, envolvida em mil negócios, mil “projetos”.
A garota saiu, definitivamente, das ruas, e ganhou as capas dos jornais. Acho que dava menos prejuízo onde estava, cuidando da própria vida sem querer “influenciar” a dos outros.
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